Já se pegou no turbilhão de tarefas, responsabilidades e preocupações, sentindo-se exausto(a), mas paradoxalmente com a sensação de estar “dando conta de tudo”? Essa familiaridade com a sobrecarga — seja no âmbito profissional, familiar ou emocional — muitas vezes nos ilude com a crença de que estamos no controle.
Por trás da aparente organização e produtividade frenética, existe uma linha tênue e silenciosa que separa o cuidado genuíno da necessidade de controle.
O livro A Psiquiatria de Deus, do autor Charles L. Allen abre exatamente com essa provocação espiritual: “Nunca encontrei uma única pessoa com problemas mentais, emocionais ou relacionais que não estivesse, em algum nível, em desobediência a um princípio de Deus.” Essa afirmação não visa culpar, mas abrir os olhos para o impacto que viver fora da orientação divina gera em nossa alma.
Quando não percebida, essa linha pode nos conduzir a um estado de alerta constante, esgotamento e frustração. Vamos aprofundar essa reflexão e entender como a sobrecarga emocional pode ser, na verdade, um disfarce sutil da tentativa de dominar o incontrolável.
Desvendando a Sobrecarga
A sobrecarga não surge apenas da quantidade de tarefas, mas da carga emocional que elas carregam. Ela se apresenta no acúmulo de compromissos que nos deixam sem fôlego, nas preocupações que dominam nossos pensamentos e na sensação de que, se não fizermos, tudo desmorona.
No início, os sinais podem ser quase invisíveis: leve irritabilidade, cansaço mental, dificuldade em desacelerar. Com o tempo, surgem lapsos de memória, tensão muscular, insônia, e até o adoecimento do corpo — resultado de um sistema que opera além dos seus limites.
E essa sobrecarga, muitas vezes, assume “máscaras” que tentam justificar seu peso: O faz-tudo, que se sente indispensável; O perfeccionista, que assume tudo para garantir que nada falhe; O cuidador excessivo, que se coloca em último plano e acredita que cuidar do outro é sua única função.
Mas será mesmo cuidado… ou já cruzamos o limiar para o controle?
A Ilusão do Controle
Controlar é uma tentativa natural de buscar segurança em um mundo imprevisível. É um instinto humano. No entanto, quando esse impulso se transforma em uma necessidade constante de dominar tudo e todos — inclusive as emoções alheias e os desfechos futuros — nasce a ilusão de que o controle é possível.
E essa ilusão é alimentada pela sobrecarga: Quanto mais fazemos, mais sentimos que estamos “evitando que algo ruim aconteça”.
Quanto mais nos antecipamos, mais sentimos que “estamos um passo à frente”. Mas, na verdade, estamos apenas fugindo da nossa vulnerabilidade — daquilo que não podemos prever, consertar ou impedir.
Essa narrativa interna de controle oferece uma falsa sensação de segurança, mas esgota nossas forças e distorce nossa percepção de fé, confiança e limites.
O autor Charles L. Allen nos lembra disso quando afirma, já no início do livro, que muitos dos conflitos da alma não são apenas emocionais — são espirituais. A saúde emocional e espiritual tende a se fragilizar quando a vida é conduzida de forma desconectada de princípios que promovem ordem, propósito e sentido.
O Salmo 23, um dos versículos destacado pelo autor, revela a cura mais profunda para essa inquietude:
“O Senhor é o meu pastor; nada me faltará… Guia-me mansamente…”
A mansidão de Deus confronta nossa pressa. Seu cuidado nos convida ao descanso.
E é nesse lugar de descanso que ouvimos com clareza a ordem amorosa de Deus:
“Aquietai-vos e sabei que Eu sou Deus.” (Salmo 46:10)
Aquietar-se não é passividade. É rendição ativa. É soltar o controle para permitir que Deus governe. É lembrar que Ele é Deus — e nós não somos.
A Conexão Perigosa: Quando a Sobrecarga Vira Estratégia de Controle
Pode parecer nobre assumir muitas responsabilidades. À primeira vista, soa como zelo, prontidão, excelência. Mas, muitas vezes, trata-se de medo disfarçado.
Medo de falhar. Medo de decepcionar. Medo de não ser suficiente. Medo do abandono. Então, assumimos demais, fazemos por todos, tentamos controlar resultados, sentimentos, escolhas alheias… e acabamos nos afastando de uma postura de entrega confiante e amorosa.
Nos relacionamentos, isso se traduz em rigidez, cobranças e falta de espaço para o outro crescer. No trabalho, aparece na dificuldade de delegar e na ansiedade por perfeição. Na vida familiar, emerge como superproteção, tirando do outro a oportunidade de amadurecer.
Essa sobrecarga estratégica não é uma virtude. É um alerta.
Os Custos da Ilusão
A tentativa de controlar por meio da sobrecarga emocional gera consequências reais — e dolorosas. O corpo adoece: estresse, ansiedade, dores tensionais, fadiga crônica. A mente se exaure: pensamentos acelerados, insônia, sensação constante de urgência.
Os relacionamentos se desgastam: o excesso de controle gera ressentimento, distância, desconfiança. E a alma se entristece: perdemos a leveza, a espontaneidade, a alegria de simplesmente existir.
Viver assim é caminhar com a alma pesada, mesmo nos dias em que tudo parece “sob controle”.
Um Novo Caminho: Deixar Ir Para Viver Melhor
É preciso coragem para reconhecer que nem tudo está em nossas mãos. Que o cuidado genuíno exige entrega, fé e confiança — e não controle disfarçado de responsabilidade.
Esse é o convite: Aprender a dizer “não” com amor. Delegar sem culpa. Estabelecer limites sem medo de rejeição e de abandono. E, sobretudo, entregar nas mãos de Deus o que não nos pertence.
O caminho da leveza começa quando paramos de carregar o que nunca foi nosso. E se precisar de ajuda nesse processo, buscar apoio profissional pode ser um divisor de águas. Soltar o controle não é desistir — é confiar.
E quando confiamos de verdade, a vida flui com mais paz, verdade e autenticidade.
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